BRAINN CONGRESS ENTREVISTAS – sobre robôs com cérebros orgânicos


Brainn Congress Entrevistas - Nathalia Peixoto
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Pesquisadora Nathalia Peixoto, da George Mason University, revela como a interdisciplinaridade a ajuda a desenvolver linhas de pesquisas inovadoras.

13 de abril de 2017     Por Ricardo Schinaider – Redação WebContent

 

Controlar robôs utilizando cérebros de animais pode parecer ficção científica, mas era tema que interessava Nathalia Peixoto já na época da graduação.

Nathalia cursava Engenharia Elétrica, mas sua curiosidade e fascínio por outras áreas do conhecimento a levaram a explorar diversos laboratórios da Unicamp, onde estudava. Nos dias 27 a 29 de março, Nathalia voltou à Universidade para participar como palestrante convidada do IV Congresso do BRAINN. Em entrevista ao portal do CEPID, ela contou um pouco de sua trajetória e ressaltou o papel fundamental da interdisciplinaridade na carreira acadêmica.

 

INTERDISCIPLINARIDADE NO CENTRO DOS ESTUDOS

“Fiz iniciações científicas em Matemática, Biologia e até mesmo em Linguística”, recorda a cientista. “Eu me interessava por tudo. Pegava minha bicicleta e andava por todos os institutos. E acredito que essas experiências me deram uma visão diferente daquela que tem uma pessoa que, por exemplo, fez iniciação científica apenas em Engenharia Elétrica”.

Eu me interessava por tudo. Pegava minha bicicleta e andava por todos os institutos.

nathalia peixoto - pesquisadora

A pesquisadora Nathalia Peixoto, uma das cientistas convidadas do 4º BRAINN Congress

Dentre todas as áreas que conheceu e estudou, Nathalia escolheu a Engenharia Biomédica para fazer o Mestrado. A opção não veio apenas da vontade de unir cérebros e máquinas, mas também porque “conhecemos diversos problemas neurológicos, e achava que a Engenharia Elétrica poderia ajudar na solução de muitos deles”, relembra.

Saiba mais sobre o 4º BRAINN Congress

 

No projeto de Mestrado, a pesquisadora utilizou ferramentas de engenharia para estudar modelos de enxaqueca. Assim, a interdisciplinaridade que marcou sua graduação continuou acompanhando-a pela carreira, tanto no doutorado na USP como no pós-doutorado em Stanford, e hoje continua presente em seu laboratório de pesquisa na George Mason University, nos Estados Unidos. As linhas de pesquisa abordadas pelo laboratório são variadas, mas sempre buscam unir a engenharia elétrica com a neurociência.

“Desenvolvo projetos com meus alunos relacionados a cadeiras de rodas controladas por voz, medição de neurotransmissores no cérebro e estudo do vício: como se forma e se é possível livrar-se dele estimulando o cérebro eletricamente”, conta Nathalia.

 

TRAZENDO O ORGÂNICO PARA O MUNDO DOS ROBÔS

A ideia de controlar robôs usando cérebros – um conceito sempre presente na mente curiosa de Nathalia – é a base de um de seus mais interessantes projetos, que tem ganhado crescente notoriedade na mídia.

A cientista e seu grupo de estudos trabalham no desenvolvimento de robôs autônomos, com componentes biológicos e que possam ser utilizados em situações de alto risco para seres humanos – como, por exemplo, em acidentes que envolvem radioatividade, elementos químicos ou chances de explosão.

“Para desenvolver o modelo, o primeiro passo é extrair o cérebro de camundongos e colocá-lo em uma solução com temperatura adequada para mantê-lo ativo”, explica Nathalia. “Em seguida, colocamos parte do cérebro em uma espécie de chip de computador, onde conseguimos estimulá-lo e medir a resposta das células”.

O primeiro estímulo elétrico aplicado ao cérebro é ameno, e a reação dos neurônios é fraca. Já o segundo estímulo elétrico é extremamente forte. Alguns minutos após o estímulo forte, o estímulo fraco é aplicado novamente. Dessa vez, entretanto, a reação dos neurônios é bastante diferente.

estudo de nathalia peixoto na george mason university 2

Uma das vantagens dessa interface bioeletrônica é que o robô seria completamente autônomo, ou seja, não dependeria de internet ou de sistemas GPS para funcionar.

“A resposta é cerca de 10 vezes mais intensa quando comparada à do primeiro estímulo”, diz Nathalia. “Isso mostra que as células conseguem lembrar de um estímulo específico. Queremos provar que podemos usar essa capacidade do cérebro para fazê-lo reconhecer e lembrar de uma série de padrões e, eventualmente, utilizá-lo para controlar um robô. Uma das vantagens dessa interface bioeletrônica é que o robô seria completamente autônomo, ou seja, não dependeria de internet ou de sistemas GPS para funcionar”.

 

ESTUDOS PROMISSORES SOBRE O ALZHEIMER

placas beta amilóides

As placas são formadas quando pedaços da proteína beta-amilóide se agrupam. Os pequenos agrupamentos podem bloquear a sinalização entre as células nas sinapses. Eles também podem ativar as células do sistema imunológico que causam inflamações e devoram células deficientes. Fonte: Alzheimer´s Association

A pesquisadora ressalta que, com apenas um camundongo, é possível obter 50 frações de cérebro e, consequentemente, controlar 50 diferentes robôs. Esse procedimento, que permite obter um grande número de amostras a partir de um único animal, é atraente também para pesquisas que buscam testar medicamentos contra doenças neurológicas e neurodegenerativas. O próprio grupo de Nathalia já utilizou esta abordagem para avaliar, por exemplo, os efeitos protetores do turmérico na Doença de Alzheimer.

O experimento consistiu em adicionar placas de proteína beta-amilóide (características na Doença de Alzheimer) na solução contendo parte do cérebro de um camundongo. Em algumas soluções, o turmérico também foi acrescentado. O resultado mostrou que as células cerebrais das soluções contendo turmérico demoraram mais para sofrer os efeitos neurodegenerativos das placas beta-amilóides do que os controles. As possíveis implicações dessa descoberta são enormes, inclusive para pacientes da doença, e continuam a ser exploradas pelo grupo.

 

NOVAS PESQUISAS, NOVAS PARCERIAS

Para o futuro, a pesquisadora pretende continuar unindo engenharia com neurociência para o desenvolvimento de novos robôs e para o estudo de doenças neurológicas. Além disso, deseja também iniciar colaborações com o BRAINN. Para Nathalia, o CEPID possui o ambiente interdisciplinar ideal para o desenvolvimento de projetos nessas áreas.

“Aqui vemos físicos conversando com neurocientistas, neurocientistas conversando com engenheiros, engenheiros conversando com médicos e assim por diante”, detalha a cientista.

“Por isso, acredito que o BRAINN ofereça esta oportunidade para a interdisciplinaridade que hoje é crítica para se fazer pesquisa”, conclui Nathalia.

 


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