BIPMed busca parcerias para ampliar banco público de dados genômicos e clínicos


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Texto da Agência FAPESP destaca a importância de número maior de voluntários para ampliar o escopo do banco de dados genético.

16 de Novembro de 2016     Por Karina Toledo|Agência FAPESP

 

Lançado há um ano, a Brazilian Initiative on Precision Medicine (BIPMed), o primeiro banco público de dados genômicos da América Latina, já reúne informações de 254 indivíduos da região de Campinas, interior de São Paulo.

Os voluntários passaram pelo sequenciamento completo do exoma – parte do genoma onde ficam os genes codificadores de proteína e, portanto, onde há mais chance de ocorrerem mutações causadoras de doenças.

Vale ressaltar que essa amostra não é composta por pacientes incluídos em estudos, mas por pessoas saudáveis que representam a estrutura genética da coorte de pacientes que participa dos estudos do Instituto de Pesquisa sobre Neurociências e Neurotecnologia (BRAINN, na sigla em inglês), um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) financiado pela FAPESP.

Os voluntários foram recrutados entre os acompanhantes dos pacientes atendidos no Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O desafio é ampliar essa base de dados genética, incluindo amostras de todo o país.

“Incluir dados de pacientes é o objetivo final, mas, se não tivermos uma boa base de dados representativa da variabilidade genética da população brasileira, as informações nunca serão úteis para a prática da medicina de precisão”, disse Iscia Lopes-Cendes, professora da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM-Unicamp) e integrante do BRAINN.

“Primeiro, é preciso entender o que é o normal em uma população para poder identificar uma variável aberrante. Por isso, precisamos incluir dados de indivíduos de outras regiões do estado e do país”, disse.

Além de dados genômicos – genes, transcritos e polimorfismos – os pesquisadores pretendem trabalhar no futuro com outros aspectos importantes para a medicina de precisão.

“Pretendemos desenvolver algoritmos para a identificação de variantes patogênicas e também encontrar meios de lidar com os metadados, ou seja, as informações clínicas que são importantíssimas quando queremos fazer correlações em termos de diagnóstico”, disse Lopes-Cendes.

A BIPMed foi criada em 2015 por pesquisadores do BRAINN e de outros quatros CEPIDs: Centro de Pesquisa em Engenharia e Ciências Computacionais (CCES), Centro de Pesquisa em Terapia Celular (CTC), Centro de Pesquisa em Obesidade e Comorbidades (OCRC) e Centro de Pesquisa em Doenças Inflamatórias (CRID).

Integrantes da BIPMed se reuniram no auditório da FAPESP, no dia 10 de novembro, no evento “BIPMed: One Year and Forward”, que reuniu possíveis futuros colaboradores da iniciativa com representantes dos cinco CEPIDs.

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Iscia Lopes-Cendes, da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp e integrante do BRAINN (Foto: Leandro Negro/Agência FAPESP)

 

Segundo Cristiane Rocha, pesquisadora da FCM-Unicamp, as informações até o momento disponíveis no banco de dados genômicos da BIPMed já foram consultadas por pessoas de 73 países. “Em média, temos 143 acessos diários, com picos de até 800 em um único dia”, disse.

Parte dos acessos se deve à parceria com a The Global Alliance for Genomics and Health (GA4GH) – consórcio internacional fundado em 2013 com o propósito de ajudar pacientes, pesquisadores e médicos a obter avanços científicos por meio do compartilhamento responsável de dados.

Um dos projetos mais conhecidos do GA4GH é o Beacon, no qual as instituições associadas – entre elas a BIPMed – oferecem um serviço on-line capaz de responder perguntas simples (com “sim” ou “não” como respostas) e que não violem informações consideradas sigilosas. São consultas como, por exemplo, “você tem em seu banco algum genoma com um ‘A’ na posição 100.735 no cromossomo 3?”

Mais recentemente, a BIPMed fechou parceria com o The Human Variome Project, organização internacional não governamental dedicada a garantir que dados sobre variantes genéticas e seus efeitos na saúde humana sejam coletados, avaliados, interpretados e compartilhados abertamente.

Outra nova parceria anunciada durante o encontro foi com a professora Vera Lúcia Gil da Silva Lopes, da FCM-Unicamp, que pretende compartilhar no banco da BIPMed dados clínicos e de sequenciamento de genes de 1,6 mil pacientes com fissuras labiopalatinas sindrômicas e não sindrômicas. A base de dados é fruto de diversos projetos apoiados pela FAPESP.

“Sempre foi nossa estratégia divulgar os dados. Eles já foram planejados, seguindo padrões internacionais de nomenclatura e terminologia, para serem integrados com outras bases de dados”, disse Silva Lopes.

De acordo com Lopes-Cendes, outra base que em breve deve ser agregada à da BIPMed é a de pacientes com câncer atendidos na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP), no âmbito de estudos coordenados pelo professor Wilson Araújo da Silva Junior.

Ainda entre os possíveis futuros colaboradores presentes no evento destaca-se a equipe do Centro de Pesquisa sobre o Genoma Humano e Células-Tronco (HUG-CELL), que anunciou durante o evento o lançamento do site do Arquivo brasileiro on-line de mutações (AbraOM) – um banco de dados que reúne exomas de 609 idosos saudáveis da cidade de São Paulo e pode ser considerado hoje o maior banco genômico de dados brasileiros.

Os voluntários que doaram o material genético para compor o banco integram a coorte do inquérito sobre Saúde, bem-estar e envelhecimento (SABE), um estudo multicêntrico coordenado pela Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) e apoiado pela FAPESP em São Paulo.

Segundo Mayana Zatz, coordenadora do HUG-CELL, nessa população já foram encontradas 45 mil variantes genéticas que não estão presentes nos bancos internacionais – o que, segundo ela, reforça a importância de criar repositórios de dados brasileiros.

 

Dados compartilhados

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Claudia Bauzer Medeiros, professora do Instituto de Computação da Unicamp e membro do CCES (Foto: Leandro Negro/Agência FAPESP)

 

Lopes-Cendes conta que o objetivo principal dos pesquisadores da BIPMed é criar ferramentas para promover e facilitar o compartilhamento de dados genômicos e clínicos – contribuindo, assim, para o avanço no tratamento de doenças e criando um ambiente favorável à implantação da medicina de precisão no Brasil.

“Nosso maior desafio agora é expandir esse banco de dados. Vejo com muito bons olhos a inclusão de novos grupos de pesquisa – e aqui há vários grupos importantes do Estado de São Paulo. Aqueles que têm dados, gostariam de compartilhar, têm autorização para compartilhar, mas não sabem onde, podem contar conosco. Podemos ajudar a hospedar os dados e também no processo de transferência e depósito”, disse.

Presente na abertura do evento, o diretor científico da FAPESP, Carlos Henrique de Brito Cruz, afirmou que a BIPMed é um exemplo de como os pesquisadores podem por iniciativa própria – sem serem estimulados por agências de fomento – organizar uma colaboração relevante, de enorme potencial. “É um tipo de iniciativa que demonstra um grau de maturidade da comunidade científica de São Paulo que é bom de ver”, disse.

Claudia Bauzer Medeiros, professora do Instituto de Computação da Unicamp e membro do CCES, destacou que o compartilhamento de dados está se tornando parte da metodologia científica.

“As agências de fomento nos Estados Unidos, Inglaterra, Austrália e Holanda só financiam projetos acompanhados de um plano que determina como os dados gerados serão gerenciados e compartilhados segundo critérios de privacidade e ética”, disse.

A prática, ressaltou Medeiros, favorece a reutilização dos dados em diversos outros estudos – poupando tempo e dinheiro. Como exemplo, citou um estudo feito sobre o Protein Data Bank (www.rcsb.org/pdb/home/home.do), repositório de informações sobre a estrutura de proteínas financiado por três organizações dos Estados Unidos: National Science Foundation, National Institutes of Health e o Departamento de Energia.

“Custa bastante às agências manter o repositório. Mas o valor representa 1% do que se teria de gastar no financiamento de pesquisas para gerar novamente os dados lá depositados e disponíveis para consulta”, disse Medeiros.

Além de permitir testar hipóteses alternativas àquelas que geraram a base de dados, acrescentou, o compartilhamento favorece a reprodutibilidade das pesquisas, diminuindo o risco de fraudes.

 


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