A incrível história da ‘rainha na neurociência’ e seu prêmio Nobel


Nobel Prize Awards Ceremony 2014, Stockholm
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Conheça a história de May-Britt Moser, cientista premiada com o Nobel e descobridora de dados fascinantes sobre o funcionamento da mente.

Uma garotinha criada numa ilha distante. Sua cidade é pequena, e a população é profundamente religiosa. É proibido dançar; os familiares da garotinha falam em espíritos, e as superstições são abundantes. Seus pais enfrentam dificuldades financeiras e não têm formação universitária.

Mas a mãe, que no passado sonhou em ser médica, quer uma vida melhor para sua filha. Insiste que a menina estude muito e lhe lê contos de fadas em que os protagonistas superam a pobreza com sua inteligência.

“Nascemos nus e assim vamos morrer, portanto, não se preocupe com coisas materiais”, ela diz à filha. Em vez disso, faça aquilo que a apaixona.

Fast forward quarenta anos: a garotinha tornou-se a “rainha da neurociência”. Com sorriso estampado no rosto, May-Britt Moser se levantou para aceitar o Prêmio Nobel de Fisiologia. Seu trabalho ajudou a solucionar um problema “que preocupa filósofos e cientistas há séculos”, escreveu o comitê do Nobel, e ela foi a única mulher a receber um Nobel de ciência em 2014. E, como acontece na maioria dos melhores contos de fada, houve uma história de amor. No ensino médio Moser foi colega de seu futuro marido, Edvard, mas eles mal se conheciam. Por acaso, escolheram a mesma universidade e se reencontraram ali.

Casaram-se ainda na faculdade e juntos criaram primeiro seus filhos, depois um laboratório de pesquisas. Quando May-Britt se levantou para receber seu Nobel, Edvard fez o mesmo. O prêmio foi dado também a ele. “Temos um projeto comum e uma meta comum”, disse Edvard Moser ao New York Times. “Nós dois somos fascinados por ele. E dependemos um do outro para conseguir.”

May-Britt e Edvard passaram suas infâncias em ilhas no chamado “cinturão bíblico” da Noruega. Seu trabalho que lhes valeu o Nobel foi a descoberta das chamadas células de grade que compõem o “GPS do cérebro” – o sistema interno de mapeamento e navegação que ajuda os animais a identificar onde estão e onde estiveram. Conversei com May-Britt Moser para o Sophia, um projeto do HuffPost para reunir lições de vida de pessoas fascinantes. A cientista compartilhou sua sabedoria prática sobre como combater o estresse e dormir melhor, sobre criação de filhos, livros que a influenciaram a uma linda história sobre o melhor presente que ganhou na vida.

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Antes de lhe perguntar sobre sua vida, gostaria de saber se há alguma área nova de pesquisa que a interessa em especial?

Publicamos alguma coisa muito interessante sobre como os odores funcionam como “deixa” para a recuperação de memórias. Todo o mundo sabe, é claro, que existem certos cheiros que nos levam diretamente de volta às recordações de nossa infância – cheiros natalinos e assim por diante. E temos Marcel Proust com seus belos poemas ligando cheiros e memórias. Pudemos demonstrar isso no laboratório. Criamos uma tarefa, ensinando a ratos que, se sentissem cheiro de chocolate, deviam ficar em uma posição, e se o cheiro que sentissem fosse de banana, deveriam ficar em outra. Portanto, estamos falando em recordações olfativas e espaço ao mesmo tempo. Então entramos no cérebro e procuramos determinar o que acontece no cérebro quando o animal está aprendendo essas associações.

Conseguimos demonstrar que uma parte do cérebro – não a parte que contém as células de grade, mas sua “irmã”, o córtex entorrinal lateral – recebe informações sobre cheiros e então as transmite ao hipocampo [uma parte do cérebro que exerce papel crucial na formação de memórias]. Quando começam a oscilar juntos em determinada gama, o córtex entorrinal lateral está ensinando ao hipocampo sobre esse cheiro.

Mais tarde, quando uma ratazana farejava chocolate, por exemplo, um mapa espacial era expresso em seu hipocampo e a levava à posição certa.

 

Você descobriu algum benefício concreto, para o cotidiano, das pesquisas relacionadas a seu trabalho?

Um artigo que tem sido especialmente útil é de Bruce McEwen. Esse estudo mostrou que, quando você submete animais a estresse, eles perdem sinapses, especialmente no hipocampo. Isso me fez tomar consciência de estar estressada demais, porque sei que meu cérebro não funciona tão bem quando estou estressada. Eu me treinei a encontrar tempo para exercitar o relaxamento corporal. Tenho alguns programas. Só preciso ouvir as instruções, e são simples.

Às vezes você só precisa apertar a mão bem forte e prender a respiração. Você prende, prende, sente toda a tensão, e então relaxa. Você se concentra no que seu corpo sente quando você está realmente tensa e no que sente quando ele se descontrai. Você realmente aprende a conhecer seu corpo. Mais tarde, em reuniões e ocasiões desse tipo, uso essa técnica para relaxar e tentar ser uma humana adulta em discussões difíceis. [risos]

 

E as pesquisas ligadas à memória com as quais você trabalhou, têm tido utilidade prática?

Acho que não faço uso suficiente do que aprendi. Provavelmente deveria usá-lo mais. Tentei uma vez, porque tive que dar uma aula em um curso de psicologia e queria me testar. Usei a memória espacial e algumas outras deixas para ver se conseguia decorar o nome de todos os alunos de uma só vez. Falei a eles: “Quero aprender seus nomes agora, e em nosso próximo encontro vou mostrar o que fiz.”

Deu certo. Eu me lembrei de onde cada um se sentou e atribuí tipos a cada aluno – você me lembra disso ou daquilo. Então eu criava uma mapa mental e conseguir dar o nome de cada um.Foi um teste que fiz comigo mesma, e agora sei que funciona. Mas é claro que eu também queria impressionar os alunos. [risos]

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